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Fé em Movimento: O Mapa Religioso da Bahia e o Silencioso Clamor das Transformações Espirituais


Por Nilson Carvalho — Jornalista e Embaixador dos Direitos Humanos

 

Na terra onde o sincretismo é alma, onde sinos e atabaques coexistem sob o mesmo céu, um novo retrato da fé foi revelado. O Censo 2022, divulgado pelo IBGE, traça um panorama revelador sobre o crescimento evangélico, a retração do catolicismo e a persistência simbólica das religiões de matriz africana na Bahia — estado onde o sagrado, o histórico e o social sempre caminharam entrelaçados.

 

Mas essa mudança vai além dos números. Ela fala sobre identidade, pertencimento e ruptura de tradições que há séculos moldam o povo baiano.

 

Tanque Novo: A Fortaleza Católica do Sertão

No sertão do Centro-Sul baiano, Tanque Novo carrega a cruz e a devoção. Com 93,8% da população declaradamente católica, é o município mais católico da Bahia. Por trás das missas lotadas, das procissões e da fé enraizada no cotidiano, está uma cidade que, apesar das mudanças à sua volta, se apega ao que acredita como forma de resistência e coesão social.

 

Dom Basílio e Botuporã seguem o mesmo caminho, preservando uma fé que já não se sustenta com a mesma força nos grandes centros urbanos.

 

Em contraste, cidades como Simões Filho, Catu e Dias D’Ávila apresentam os menores índices de católicos do estado — sinal de um deslocamento religioso que acompanha o crescimento urbano e a perda de vínculos com as tradições históricas da igreja.

 

Mucuri e o Crescimento Evangélico: Vozes Novas, Fervor Renovado

O que há 12 anos era um movimento crescente, hoje se firmou como realidade. A Bahia viu o número de evangélicos crescer mais de 40%, chegando a 2,8 milhões de fiéis. Mucuri lidera a transformação: 38,6% dos seus moradores se declaram evangélicos.

 

As igrejas se multiplicam nos bairros, nas ruas, nos pequenos templos improvisados que ecoam louvores e promessas. É um crescimento que não é apenas espiritual, mas também emocional e social, onde muitos encontram alento, pertencimento, e voz em meio ao abandono e à desigualdade.

 

Evangélicos hoje representam 23,3% da população baiana, número que deve seguir crescendo — não apenas pelo discurso religioso, mas porque oferecem acolhimento, escuta e comunidade onde muitas vezes o Estado falha.

 

Umbanda e Candomblé: Tradições Resistentes em Territórios de Herança Ancestral

No berço da herança africana no Brasil, as religiões de matriz africana também resistem — aumentaram 187% na Bahia entre 2010 e 2022.

 

Embora representem apenas 1% da população baiana, são 123 mil vozes que batem os tambores da ancestralidade, do axé e da espiritualidade que sobreviveu à escravidão, ao preconceito e à intolerância religiosa.

 

Itaparica, São Félix, Cachoeira e Salinas da Margarida formam um corredor cultural e espiritual onde umbanda e candomblé não são apenas religião — são ato de existência e memória.

 

O Que Está Mudando — E Por Que Isso Importa

As mudanças nos mapas religiosos não são apenas estatísticas. Elas refletem novos sentidos de fé, rupturas geracionais, transformações sociais e a busca por pertencimento em um tempo de incertezas.

 

A fé — seja ela católica, evangélica ou ancestral — é também um espelho do que somos e do que sentimos. E quando o povo muda sua forma de crer, é porque algo profundo também está mudando na forma de viver.

 

A Bahia continua plural, intensa, viva. Mas o desafio agora é respeitar as diferenças religiosas, promover a convivência pacífica e garantir liberdade de crença em tempos de polarização e intolerância crescente.


"A fé que nos guia pode mudar de nome, mas o respeito pelo que o outro acredita precisa continuar o mesmo."

 

 Foto: IBGE / Internet

Texto: Nilson Carvalho – Jornalista e Embaixador dos Direitos Humanos


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