top of page

Energia que destrói: comunidade liga parque eólico na Bahia à morte de criança e casas rachadas



Piatã, Bahia — O que era para ser progresso virou luto. O que prometeram como “energia limpa” chegou arrastando poeira, rachando paredes, assustando os bichos e — o mais doloroso — levando embora a vida de uma criança.

 

Na comunidade de Lagoa de Bastos, no município de Piatã, região da Chapada Diamantina, o vento que antes era alento se transformou em tormenta. A instalação de um parque eólico na região, celebrada com discursos sobre sustentabilidade e avanço tecnológico, hoje é sinônimo de trauma para famílias inteiras que se sentem esquecidas, invadidas e, sobretudo, feridas.

 

A professora aposentada Delci Moreira, de 53 anos, aponta para uma placa cravada de cabeça para baixo no acostamento de uma estrada esburacada. Perto dela, uma pequena cruz fincada no chão denuncia o que as palavras não conseguem expressar: a morte de uma criança. Um acidente. Um caminhão da empresa. Um silêncio incômodo.

 

“Depois que essas torres chegaram, tudo desandou. As casas racharam, os carros deles passam em alta velocidade e a poeira não deixa a gente nem respirar. Agora, perdemos uma criança. Isso ninguém limpa”, diz Delci, com os olhos marejados.

 

Casas rachadas, animais assustados, água contaminada

As queixas se repetem em praticamente todas as famílias da comunidade. Paredes rachadas. Poços de água com gosto estranho. Animais adoecendo. Caminhões pesados transitando a toda hora por vias rurais frágeis, sem controle ou diálogo com os moradores.

 

“Nos prometeram empregos e melhoria de vida. Ficamos com a poeira, os danos e a dor”, desabafa o lavrador Seu José Gomes, de 61 anos, que hoje dorme com medo do telhado ceder em cima da esposa.

 

O que diz a empresa

Procurada pela reportagem, a empresa responsável pelo parque eólico afirmou em nota que “lamenta profundamente o ocorrido” e que “não há evidências de que suas operações tenham contribuído para o acidente ou os danos estruturais relatados”. Segundo a nota, todas as ações estão “em conformidade com as normas ambientais e de segurança”.

 

Mas quem ouve o vento quando ele traz dor?

O vento não fala, mas carrega as vozes caladas de uma comunidade que se sente traída. O progresso chegou, sim — mas não para todos. Chegou para as grandes turbinas que giram no alto da serra, gerando lucro. Para baixo, ficaram os escombros da esperança.

 

A morte da criança não pode ser tratada como número. Nem as rachaduras nas paredes podem ser apenas “efeito colateral”. Há rachaduras que não são visíveis: estão nas relações, na confiança, na dignidade.

 

O caso segue sendo investigado. Mas a comunidade já decidiu: não quer mais promessas, quer respeito. Quer que o vento volte a ser só vento — e não um mensageiro da destruição.

 

“Quando até o vento começa a matar, é sinal de que a ganância falou mais alto que a vida.”

 

Compartilhe. Reflita. O progresso que fere não pode ser chamado de avanço.


Foto: Arquivo de moradores / Lagoa de Bastos, Piatã – BA

Por Nilson Carvalho — Jornalista e Embaixador dos Direitos Humanos

 


 
 
 

Comentarios


  • Youtube
  • Instagram
  • Facebook

©2025 Papo de Artista Bahia - Todos os direitos autorais reservados.​

(71) 98682-7199
bottom of page